
Hoje quem vai escrever é a Nádia.
Andressa, Nádia e Monique caminhavam tranquilamente para a estação de trem conversando sobre diversos assuntos, rindo e relembrando a infância, os escritos, o vestido azul celeste e o amor comparado as estações do ano.
Estávamos tão animadas e a conversa era tão agradável, tão diferente. Meu Deus!
E aí o trem chegou, onde nós estávamos estava lotado e decidimos andar um pouco até chegar em um vagão que estivesse melhor, entramos e logo notei que era o terceiro vagão, a primeira porta. Senti um estalo e disse: “Não deveríamos ter entrado aqui, é o terceiro vagão e a primeira porta, o vagão do Thiago”, um gelo por dentro, meus olhos percorreram o vagão e o encontrei como se já soubesse onde ele estava.
Imediatamente a pulsação aumenta, todo o barulho do trem se transforma em chiados, ruídos e eu passo a olhar de forma encantada para ele.
Sempre foi emocionante vê-lo dormir, sempre me deu uma paz, uma vontade de não dormir e ficar ininterruptamente olhando para ele, a paz, o amor que eu sentia.
Eu que não imaginava ter essa sensação de novo estava ali diante dele sem ser ao menos percebida, quase invisível.
Olhava tão profundamente, tentei reparar em cada detalhe.
Aquela boca, que era tão minha. Boca que me beijou como nunca antes fui beijada. A boca que me encantou, me enfeitiçou e que me maltratou com suas verdades.
O mesmo tênis, a mesma calça, a mesma camiseta, que embora nova meus olhos já tinham decorado cada fibra, a mesma mochila, a mesma correntinha. Quase tudo igual se não fosse o fato de não me pertencer mais, aliás, tudo continuava igual, ele nunca me pertenceu.
Foi uma mistura de tristeza e felicidade, também pudera, eu não estava esperando, não foi planejado. Depois de passar pelo centro no domingo e a represa abrir-se eu não esperava encontrá-lo e namorá-lo de longe. Longe e perto, feliz e triste.
Um dos momentos mais lindos da minha vida embora pudesse parecer ridículo para quem visse.
Eu mal podia respirar, eu não queria parar de olhar. Aquele momento era como se fosse o último a minha vida, eu teria de aproveitar cada segundo namorando o meu amor com os olhos.
Ele estava dormindo e eu imaginando entrar nos pensamentos dele.
Aquela boca, aquela boca me chama, me clama, me prende e eu já estava louca de vontade de tê-la, no entanto, eu sabia que isso não era possível.
Um turbilhão de pensamento na minha cabeça, se eu pudesse escrever tudo o que eu senti naquele momento, tenho certeza que sairia um livro em menos de quinze minutos. Não havia papel, não havia caneta que pudesse comportar todos os meus sentimentos.
E minha estação se aproximava, a minha vontade era ir lá e ao menos beijar aquele rosto, tentar sentir o cheirinho dele, encostar nele como se o meu amor tivesse sido transformado em uma peça de museu, intocável, uma peça que eu posso apenas ver, admirar e não posso tocar mas caso isso acontecesse seria uma vitória, uma dádiva.
E assim se fez a minha vontade, pedi uma ligeira opinião para a Monique e quando o maquinista anunciou a estação eu estava lá, dei um beijo em seu rosto, se fosse um abraço ele teria sentido meu coração pulsar loucamente.
Dei um beijo em seus rosto de graça, eu o amo de graça.
Sem esperar uma palavra, uma atitude sai do trem quase desfalecida, meu coração parecia que não ia agüentar a pressão de te ver ali e lembrar que você é de outra, que você nunca me amou embora eu tenha amor maior do mundo. Atitude de ‘graça’, em todos os sentidos que a palavra graça possa admitir. Sai do trem em estado de graça inclusive. Eu e toda a minha benevolência.
Depois fiquei sabendo que as pessoas repararam na cena, ninguém entendeu praticamente nada.
Foi uma atitude da Andressa, certamente. Enquanto a Nádia assistia a tudo atônita... e antes de dormir fui surpreendida com uma mensagem: ‘ Fui pego de surpresa... Boa noite ^^ ‘
Não preciso dizer que esse boa noite vale por todas as noites que terei, com ou sem ele.
Não preciso dizer que dormi tão bem que te me atrasei hoje.
Porque qualquer palavra dele vale a felicidade de uma vida, ou de uma fração de segundos.
“Te olho nos olhos e você reclama
Que te olho muito profundamente.
Desculpa,
Tudo que vivi foi profundamente...
Eu te ensinei quem sou...
E você foi me tirando...
Os espaços entre os abraços,
Guarda-me apenas uma fresta.
Eu que sempre fui livre,
Não importava o que os outros dissessem.
Até onde posso ir para te resgatar?
Reclama de mim, como se houvesse a possibilidade...
De me inventar de novo.
Desculpa...se te olho profundamente,
Rente à pele...
A ponto de ver seus ancestrais...
Nos seus traços.
A ponto de ver a estrada...
Muito antes dos seus passos.
Eu não vou separar as minhas vitórias
Dos meus fracassos!
Eu não vou renunciar a mim;
Nenhuma parte, nenhum pedaço do meu ser
Vibrante, errante, sujo, livre, quente.
Eu quero estar viva e permanecer
Te olhando profundamente."
Ana Carolina